sexta-feira, 22 de abril de 2022

A TRAGÉDIA DE MÜNSTER - NÃO SE PODE FUGIR DA HISTÓRIA!!!

                                      A TRAGÉDIA DE MÜNSTER

 

Parte do livro (a ser publicado) “A Epopéia Dramática do Povo Batista”,

de autoria do Pr. Sérgio Aparecido Dias

             Não poderíamos finalizar a História dos Anabatistas sem nos referir ao episódio que ficou conhecido como “A Tragédia de Münster “ou “O Reino de Münster”“. Foi a famosa Revolta dos Camponeses, na Alemanha, em 1524. É bem verdade que o estudioso e pesquisador de nossa época, que dispõe de todas as fontes documentais sobre os acontecimentos ante e pós-idade média, não atribuirá aos Anabatistas, os desmandos que ocorreram na Renânia (particularmente em Münster).  Mas, infelizmente para os Anabatistas da época, os seus opositores aproveitaram-se da situação para culpá-los.

             Vamos aos fatos: verdade seja dita que a reforma protestante, particularmente na Alemanha, revestiu-se de características nacionalistas.  O Feudalismo, sistema caótico implantado na Europa Medieval, por força das circunstâncias de desgoverno (especialmente após a morte de Carlos Magno) e do avanço dos bárbaros Vikings, aliado às conquistas muçulmanas, dividiu os países em províncias ou territórios, também denominados cantões (como os cantões suiços, por exemplo).  A Alemanha estava esfacelada e até o idioma alemão puro era quase desconhecido nalguns cantões.  A preservação da cultura e das tradições dependia, quase sempre, dos mosteiros, conventos e abadias.

             Particularmente a Saxônia, cujo chefe político-militar Frederico, era amigo e defensor de Martinho Lutero, teve participação vital no movimento reformista.  Não fosse o apoio de Frederico, Lutero teria sido morto pelas tropas do papa Leão X, ao retornar da Dieta de Worms, onde foi julgado perante os maiores teólogos romanistas.  Apesar de não ter sido condenado (e ter um salvo-conduto), cavaleiros encapuzados o esperavam na estrada para Wittemberg, com o objetivo de raptá-lo e matá-lo.  Mas Frederico também enviou seus cavaleiros (também encapuzados) e estes raptaram Martinho Lutero e o levaram a salvo para um dos castelos de Frederico, na Saxônia.  É a esse castelo que Martinho Lutero se refere em seu famoso hino “Castelo Forte."

             Nesse castelo, pelo espaço de 2 anos, Lutero traduziu a Bíblia para o alemão.  Mas não o alemão corrompido pela "linguagem de hoje" daquele tempo, mas o alemão puro e castiço, o alemão clássico, fator de união dos cantões numa só e grande Alemanha, uma das maiores forças da Europa e do mundo.  Se hoje a Alemanha fala um único idioma, deve isso a Martinho Lutero.  Se a Alemanha é hoje uma das maiores potências mundiais, deve render tributo à reforma protestante.  Os alemães tiveram que reestudar o alemão, pois tinham sede de ler a Bíblia em seu próprio idioma.  Aprenderam muito mais que o idioma: descobriram a liberdade e a nacionalidade.  

             Era o início do fim do Feudalismo.  E toda a Europa seguiria o exemplo alemão, cada qual dos países procurando a sua própria identificação.  Até mesmo os conquistadores Vikings se nacionalizaram em seus territórios conquistados e lentamente se formariam, mais tarde, a Tchecoslováquia, Suécia, Dinamarca e demais nações da média e baixa Europa.  Mas era difícil, para os antigos senhores feudais, abandonarem os territórios onde dantes viviam como reis, explorando o povo.  Até mesmo bispos católico-romanos eram senhores em vários feudos, na Alemanha e na Espanha.  E tinham o apoio de reis e imperadores.

             A Renânia (na Alemanha) era também dividida em Feudos.  E a região, cujo centro era Münster, tinha como senhor feudal um bispo católico-romano.  Mas o próprio povo, de origem camponesa, estava farto das explorações do bispo.  Organizaram uma grande revolta, conhecida na História como "A Revolta dos Camponeses" e conseguiram expulsar o bispo e suas tropas, declarando Münster um território livre e independente.  Formou-se um govêrno emergencial e Bernardo Rothmann, pregador luterano, assumiu o controle da situação.  Propagou-se a notícia: Münster era livre e tinha como líder um reformista luterano.  Breve, Münster se tornaria refúgio para Anabatistas e dissidentes  do romanismo, fartos de perseguições e sofrimentos.  Todos os que para lá seguiriam em busca de refúgio e liberdade, porém, sem saber seriam cercados numa armadilha mortal e sem saída.  Münster estava destinada a ser o palco de um hediondo massacre

             Mas retornemos um pouco na História, para encontrarmos as personagens centrais desse drama de horror, que pouco a pouco comporiam o elenco dessa tragédia.  O nome mais destacado é o de Melquior Hofmann, considerado o mentor espiritual do Reino de Münster, por ter sido o disseminador do advento da Nova Jerusalém na Alemanha. Pouco se sabe de sua vida anterior à sua adesão ao Luteranismo, quando tinha cerca de 30 anos, a não ser que nascera na Suábia, em 1495.  Tornou-se tão ardoroso defensor das idéias de Lutero que passou a exercer as funções de pregador por conta própria, a princípio tendo o apoio e simpatia do reformador.  Teve grande aceitação na Suécia, Dinamarca, Holanda e ao norte da Alemanha.

             Seus sermões escatológicos e suas conclusões estapafúrdias e confusas, logo atrairiam a ira do próprio Lutero.  Quando Melquior Hofmann tentou assumir permanentemente o púlpito de uma Igreja na Dinamarca, Lutero se opôs e afirmou que Hofmann não tinha competência e nem vocação divina para pregar.  O próprio rei da Dinamarca, Frederico X, expulsou-o do país, por não concordar com a sua pregação escatológica.  Decepcionado, Melquior Hofmann abandonou os luteranos e entrou em contato com os Anabatistas, em Estrasburgo (na Alemanha) e por eles foi recebido e batizado, em 23 de abril de 1530.  Foi de curtíssima duração o seu tempo entre os Anabatistas, pois eles também rejeitaram as suas interpretações proféticas e não apoiaram as suas idéias de uma Nova Jerusalém alemã.  Que esse registro histórico fique bem claro na mente de cada um:  os anabatistas alemães não apoiaram as idéias de Hofmann!!!

            Deixando os Anabatistas, Hofmann saiu da Alemanha e foi para a Holanda, onde conheceu aquele que seria o líder dos amotinados de Münster: Jan Mathys, a quem batizou e foi o seu mais destacado discípulo.  Logo, Jan Mathys destacou-se em várias atividades "evangelísticas " e cresceu em liderança.  Apesar de serem unidos pelas mesmas heresias, não foi possível continuarem juntos e houve um inevitável rompimento entre eles.  Jan Mathys enviou vários de seus discípulos a pregar e batizar, enquanto Melquior Hofmann percorria outras regiões da Holanda, anunciando a vinda de Jesus e predizendo a instalação da Nova Jerusalém na Alemanha. Estava ele em suas atividades, quando recebeu a visita de um colega que se dizia profeta, portador de um recado profético especial.  A "profecia" dizia que ele, Hofmann, deveria voltar para Estrasburgo, onde seria preso por seis meses.  Ao findar esse tempo, Jesus Cristo voltaria e Hofmann seria libertado, liderando os Anabatistas em procissão vitoriosa através do mundo.  Acreditando ser verdadeira a "profecia " Melquior Hofmann regressou à Alemanha e apresentou-se em Estrasburgo, anunciando ser o profeta Elias, preanunciador da segunda vinda de Cristo e que Estrasburgo seria a Nova Jerusalém.

             Devido ao ridículo da situação ninguém lhe deu ouvidos, muito menos os Anabatistas.  Alguns de seus antigos discípulos alemães o auxiliaram na disseminação da heresia e, com isso, conseguiram alguns adeptos entre o povo desconhecedor da Palavra de Deus.  Curiosamente, Hofmann instruiu os seus discípulos a não batizarem e nem forçarem nenhum convertido a sair da Igreja Católica., pelo espaço de 2 anos, mas que aguardassem novas ordens (certamente proféticas).  Os Anabatistas alemães manifestaram público repúdio às idéias de Melquior Hofmann e seu grupo.  Melquior, por sua vez, negou o seu anterior batismo e criticou severamente os Anabatistas, por não aceitarem " as revelações de Deus."

             E tanto fez, e tanto desafiou as autoridades, que finalmente foi parar na prisão, em maio de 1533.   Confiante e crédulo quanto ao fiel cumprimento da "profecia," esperou pacientemente que se passassem os 6 meses para a sua libertação e a vinda de Cristo, que se daria em novembro de 1533.  Mas... para o seu desespero, 10 novembros se passaram, até que o infeliz profeta morreu na prisão em 1543, exatamente 10 anos depois!  Mas infelizmente as suas idéias não morreram com ele, pois Jan Mathys continuaria a levar avante as suas heresias da Nova Jerusalém Alemã.   Regressando à Alemanha, assumiu a liderança dos discípulos de Hofmann.  Desse modo, o figurante principal da tragédia de Münster se aproximava do palco da tragédia.

             Cabe, nesse ponto de nosso estudo, abrir um parêntesis (seguindo o princípio de J. Reis Pereira, em sua obra "Breve História dos Batistas ") para um esclarecimento importante.  Cerca de 300 anos após a morte de Melquior Hofmann, outro falso profeta ( e ex-pregador Batista ) Willian Miller, também conhecido como Guilherme Miller, nos Estados Unidos, levantou-se como profeta, anunciando a vinda de Jesus e até marcando a data exata do advento.  Jesus não veio, mas foi o início do movimento Adventista, base para o surgimento da Igreja Adventista do Sétimo Dia, com suas heresias a respeito do sábado e da lei e suas profecias falsas sobre a vinda de Cristo.  Pode-se culpar os Batistas pelas idéias heréticas e falsas de Guilherme Miller?!?  Certamente que não, bem como não podemos culpar os Anabatistas pelas loucuras de Melquior Hofmann. 

             Como bem o disse J. Reis Pereira (obra citada pg.72,73), Hofmann e Miller passaram pelos Anabatistas e Batistas, sem, no entanto, terem compromisso com a verdade do Evangelho.  Ambos foram fiéis aos seus princípios loucos e particulares, sem absorver os ensinamentos retos daqueles fundamentalistas cristãos.  Os falsos profetas revelam as suas loucuras através do não cumprimento de suas "profecias".  E o repúdio às suas idéias, por parte dos Anabatistas e dos Batistas, exime todos os fundamentalistas de quaisquer responsabilidades.  Isso se aplica corretamente no episódio de Münster. Jan Mathys, sabendo que Münster se libertara e que a liderança era protestante, viu nisso uma boa oportunidade de inaugurar a Nova Jerusalém na Alemanha.  Chegando com seus "apóstolos " e discípulos em Münster, apresentou-se como Enoque, a segunda testemunha de Cristo (já que a primeira testemunha, Hofmann, que teria sido Elias, fora morta).  Estrasburgo, "que aprisionava os profetas," perdera a honra de ser a Nova Jerusalém.  Deus transferira essa honra para Münster.  Jan Mathys assumiu o comando da cidade e tratou de organizar a sua defesa contra as tropas do bispo, que, a essas alturas, já cercava a cidade.  Numa das batalhas Jan Mathys foi morto e um de seus "apóstolos," Jan Bockelson, que passou à História com o nome de João de Leyde, assumiu a liderança.

             Antes de morrer, Jan Mathys instituira o batismo obrigatório dos adultos, uma distorção do pensamento Anabatista, para os quais o batismo era um ato absolutamente voluntário, provindo da livre vontade de uma alma convertida.  João de Leyde auto-denominou-se o rei Daví e instituiu a poligamia, organizando o seu harém particular.   Nada dessas aberrações teria o apoio dos Anabatistas, que sempre foram zelosos da moral e dos bons costumes, práticas herdadas pelos atuais Batistas.   Certo que havia entre os dissidentes refugiados em Münster, vários Anabatistas, mas não participaram da liderança do movimento.  Os líderes eram os seguidores de Jan Mathys, disso não resta a menor dúvida.  Os líderes tinham, forçosamente, que defender as antigas idéias de Melquior Hofmann, transmitidas a Jan Mathys, João de Leyde e seus seguidores.

             Finalmente, em 24 de junho de 1535, depois de mais de 1 ano de reinado, Münster foi retomada pelas tropas do bispo.  João de Leyde foi executado 1 ano e meio depois, com 2 de seus auxiliares diretos e os 3 cadáveres foram colocados em gaiolas de ferro, suspensas na fachada de uma das Igrejas da cidade.  Todos os seguidores de Jan Mathys e João de Leyde, bem como todos os moradores de Münster foram mortos.  O total de homens existentes na cidade não foi além de 1.700, havendo entre 5 a 6 mil mulheres       (talvez se entenda o porquê da instituição da poligamia). Como já vimos, não poderiam ser considerados Anabatistas.  E mesmo se o fossem, os Anabatistas na época contavam com dezenas de milhares de adeptos.  Portanto, os que se envolveram com o episódio de Münster representavam a minoria absoluta.

             Mas a tragédia de Münster foi apenas o início das matanças.   Nos 10 anos seguintes, de 1535 até 1545, cerca de 30.000 Anabatistas foram mortos, só nos chamados "países baixos".   Mas também na Inglaterra, Suiça, Áustria, Morávia e na Itália, registraram-se matanças de Anabatistas, mas não dispomos de números exatos de mortes.  Mesmo porque, naquela época, quaisquer grupos dissidentes eram muitas vezes chamados "Anabatistas."  De qualquer forma, como sabemos que os verdadeiros Anabatistas jamais optaram pela violência e nem defenderam princípios aberrantes à verdade neotestamentária, deve ficar claro para nós que eles não tiveram nada a ver com Münster.

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