A data 19 de abril foi escolhida para a celebração do “Dia do Índio”, ou “Dia dos Povos Indígenas” porque foi nesse dia que delegados indígenas, representantes de várias etnias de países como o Chile e o México, reuniram-se, em 1940,no Primeiro Congresso Indigenista Interamericano. Essa reunião tinha o propósito de discutir várias pautas a respeito da situação dos povos indígenas após séculos de colonização e da construção dos Estados Nacionais nas Américas.
No
início do século XX, havia um interesse muito grande por essas etnias, especialmente
com o desenvolvimento da Etnologia,
isto é, o ramo da Antropologia que
se dedica aos estudos das chamadas “culturas primitivas”. O esforço pela
compreensão dos hábitos e da importância dos povos indígenas para história
despertou a atenção também para as questões relacionadas às políticas públicas
que visassem à salvaguarda desses hábitos e costumes, além de direitos e
deveres.
O
Primeiro Congresso Indigenista Interamericano serviu como agenda programática
para essas políticas públicas. Uma das decisões tomadas foi a escolha do dia em
que ocorreu o congresso como o Dia do
Índio. A partir do ano seguinte, vários países do continente americano
passaram a incluir em seus calendários o 19 de abril como dia de homenagem aos
povos nativos ou indígenas.
À parte dessas importantes conquistas,
porém, seguem-se várias correntes paralelas, que tanto beneficiam, quanto
causam malefícios às comunidades indígenas. Uma delas, que, em princípio, visava
trazer somente benefícios, tornou-se também fontes de diversos problemas e
choques culturais.
Falo da aculturação, que é
o processo da inclusão dos indígenas no ambiente cultural das nações onde eles
residem. Desde os primeiros contatos com os chamados “civilizados”, os
indígenas são seduzidos e atraídos com presentes, na tentativa de ganhar-lhes a
amizade. Pouco a pouco essas seduções trazem os mais diversos resultados. Em
pouco tempo, dependendo das habilidades do “sertanista” ou do antropólogo, toda
uma tribo é pacificada e se torna “amigável”. Logicamente, essa “amizade” tem
estreitíssimas relações com os presentes que recebem!
Isso se não nos recordarmos das
barbaridades e atrocidades cometidas pelos chamados “bandeirantes”, que
dizimaram centenas de índios ao longo de suas “bandeiras” e “descobertas”. Na
verdade, tribos inteiras foram aniquiladas nessas “conquistas”, tendo os
sobreviventes que se submeter à condição de trabalhadores escravos. E a não
poderem ter nenhuma reação pelas suas mulheres e filhas servirem aos apetites
bestiais dos conquistadores. Suas aldeias foram queimadas e eles se reduziram a
carregadores de mercadorias dos conquistadores.
Muitas dessas tribos, compostas de
povos valentes e outrora orgulhosos, se tornaram pequenas povoações, com
algumas centenas de homens desonrados e domesticados, vivendo da caridade dos “civilizados”.
Muitas de suas filhas se tornaram prostitutas, ou servem hoje de enfeites de “festas
folclóricas”, que tem como objetivos mostrar o corpo semi nú das jovens
indígenas, além de promoverem o chamado “turismo sexual”. E delimitar as suas
áreas de ação, com as chamadas “reservas indígenas, também nunca levaram a nada, pois eles não são
mais nômades e não mais vivem da caça e pesca como os seus ancestrais.
Mesmo a religião cristã, que deveria
ser um bálsamo curativo para as feridas causadas pela “civilização”, pouco tem
feito para mudar essa situação. O Catolicismo, desde o início da “descoberta”
do Brasil, impingiu o Cristianismo pela força das armas e pela sedução dos
presentes! Os “bandeirantes” sempre contaram com o apoio e a “bênção” do clero,
especialmente dos “Jesuítas”! Festas religiosas e “missas” eram feitas em
comemoração às conquistas sanguinárias dos “bandeirantes” e “descobridores”.
Os índios eram “catequizados” e se
viram obrigados a aceitar a nova religião e os seus ritos, com o abandono de
seus rituais e costumes. Também foram obrigados a cobrirem a sua nudez com as
roupas e trajes de seus conquistadores. E também tiveram que mudar os seus
nomes indígenas. E assim surgiram índios “batizados” de Antônio, Maria,
Conceição, João, José....etc! Assim como já tinham feito com os negros
escravos, que foram obrigados a se “converterem” e a adotarem novos nomes de “batismo”,
tais como Benedito, Benedita (em honra a São Benedito, o santo preto), Jacinto,
Cosme, Damião...etc.
Quanto
às missões evangélicas e protestantes (tanto as americanas quanto as
nacionais), nunca escravizaram os indígenas e jamais se utilizaram das armas
para impor a sua autoridade e comando. E nunca houve relatos de mortes de
índios causados pelos missionários. Mesmo assim, muito se fala na mudança de
cultura causada por essas missões. Especialmente na demonização de seus pajés e
da “pajelança” e curandeirismo, bem como o abandono de seus deuses (muitas
vezes com ameaças de condenação eterna) por Jeová e Jesus. Seus antigos
cânticos também foram demonizados e proibidos pela nova religião. Os cânticos
evangélicos foram traduzidos nos idiomas indígenas e substituíram os antigos.
Quando
essas mudanças se dão voluntariamente, como fruto de ensino e pregação, pode
ser aceito, tanto nos aldeamentos indígenas quanto nas cidades. Mas nada
justifica a arbitrariedade e o abuso do poder econômico do “toma-lá-dá-cá”, que
geralmente prevalecem em muitos casos de “conversão”!
Voltando
aos “conquistadores” e “descobridores”, grandes cidades surgiram no rastro
sangrento dessas “conquistas”, sendo São Paulo o maior exemplo, tanto a capital
quanto o Estado. E assim os demais Estados do Brasil, especialmente Minas
Gerais, Paraná, Goiás, Bahia e todos os Estados do Norte e Nordeste. Assim, as
tribos dos Guaranís, Gês, Tapuias, Nuaruaques, Tupiniquins, Goitacazes, Cintas
Largas, Parintintins, Manaós,Barés, e muitas outras, sofreram pesadíssimas
baixas, e diversas se extinguiram.
Segundo pesquisas do antropólogo Darcy Ribeiro, em cinco
séculos, 700 das 1.200 nações indígenas foram exterminadas. 55 povos desapareceram somente na primeira
metade do século 20. Na década de 1950, a população tinha caído para um número
tão baixo que foi previsto que nenhum indígena sobreviveria até o ano de 1980.
E hoje, muitas de nossas praças,
ruas e avenidas, estão emporcalhadas com os nomes desses “bandeirantes” assassinos, tais como Raposo Tavares, Bartolomeu Bueno da Silva, conhecido
como Anhangüera (diabo velho), Domingos
Jorge Velho (Esse bandeirante, entre outras coisas, adentrou pelo nordeste
brasileiro entre 1695 e 1697, destruindo aldeias indígenas no Maranhão e no
Pernambuco, tornando centenas deles em seus escravos e carregadores de sua
bagagem). Participou ativamente do cerco
ao Quilombo dos Palmares, sendo um
dos responsáveis pela morte de Zumbí dos Palmares.
Paro por aqui. Desejo homenagear
os índios, nesse 19 de Abril de 2022 e desejar-lhes progresso em suas aldeias.
Que não se conformem com as “bolsas miséria” e a exploração turística,
especialmente com as exposições de nudez de suas jovens, incentivando o turismo
sexual nos eventos “folclóricos”! Que aceitem as novas ofertas do Governo, para
que utilizem suas terras para o manejo racional de suas riquezas, com a
assistência técnica especializada necessária e com os insumos para a produção
de alimentos.
Que
suas “reservas” se transformem em celeiros, na produção de alimentos para as
tribos e para todo o Brasil, na comercialização desses produtos! Já não vivem
mesmo da caça e pesca e de seus deslocamentos nômades. Já estão familiarizados
com a energia elétrica, uso de motores, veículos, lanchas motorizadas,
motocicletas, smartphones, celulares de última geração, televisão, Internet e
viagens aéreas.
Não são mais “inimputáveis” (aliás, jamais foram...) e têm que ser guiados e disciplinados pelo mesmo sistema de leis da Nação Brasileira. Só existe uma “nação” no Brasil, e é a Nação Brasileira, composta de todos os nativos e naturalizados que habitam nas terras do Brasil. Em Direito, chama-se de imputabilidade penal a capacidade que tem a pessoa que praticou certo ato, definido como crime, de entender o que está fazendo e de poder determinar se, de acordo com esse entendimento, será ou não legalmente punida. Pois em relação aos índios aculturados, essa jurisprudência não se aplica!!! Todos, sem exceção, devem ter os seus direitos preservados, bem como os seus deveres. Se desfrutam e gozam dos direitos, igualmente devem obedecer e respeitar as leis vigentes. Mesmo porque já estão miscigenados com os demais povos das mais diversas etnias, estudam em suas escolas e universidades e moram nas grandes cidades e capitais. Inclusive muitos são pilotos de avião, condutores de veículos, professores, técnicos em informática e operadores de máquinas pesadas e tratores. Nada justifica a sua condição de “inimputáveis” e necessitados de leis diferenciadas e brandas! Que conquistem, no seu dia-a-dia, as mesmas coisas a que todos têm o direito e a justa reivindicação! Assim, já que saíram das selvas e florestas para o mundo dos “civilizados”, andem lado a lado e contribuam para o progresso e para o bem comum.
Manaus –
AM, 19/04/2022
Pr. Sérgio
Aparecido Dias